Audiência no Senado sobre o caso Moïse tem participação da Coalizão Negra Por Direitos

Por: Caio Chagas

Na manhã de 08 de fevereiro, a Coalizão Negra Por Direitos participou da Audiência Pública “Violência contra migrantes e refugiados no Brasil e o caso Moïse” no Senado Federal. As discussões fizeram parte da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) e da Comissão Mista Permanente Sobre Migrações Internacionais e Refugiados (CMMIR), sendo feitas de forma híbrida.

A condução da reunião ficou por conta do Senador Humberto Costa (PT-PE), Presidente da CDH, e do Senador Paulo Paim (PT-RS), Presidente da CMMIR. Em sua fala de abertura, Humberto Costa destacou a importância da Audiência: “Nos últimos anos, milhares de pessoas saíram de sua terra de origem para escapar de condições precárias e vieram para o Brasil. Todavia, o país que era referência de acolhimento se mostrou palco de recorrentes ações contra imigrantes, sobretudo os negros”.

Em seguida, Lucas Santos Fernandes, Procurador do Trabalho e Representante do Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul (MPT), apresentou as condições de exploração que vivem os imigrantes e refugiados no país. “O Brasil virou um país de bicos após uma lamentável reforma trabalhista”. Lucas Fernandes ainda pontuou o racismo como agravante da violência. “Moïse tem a cor da pele que atrai o ódio e a xenofobia dos racistas no Brasil. Não podemos ver os imigrantes como concorrentes, mas sim como pessoas como nós. Essa é uma luta de todos”, finalizou.

Henrique Salles, Consultor Legislativo do Senado, apresentou dados do relatório de pesquisa “Os visíveis e invisíveis da fronteira: um estudo de caso – Segurança Alimentar e Nutricional” que revelou a fome como um dos principais motivos de deslocamento de pessoas refugiadas para o Brasil.

Dentre os dados analisados, destaca-se que a situação de segurança alimentar e nutricional pode se tornar alta em zonas de fronteira, sobretudo no contexto da pandemia da Covid-19. Como analisada no estudo de caso feito em Santana do Livramento, na fronteira do Rio Grande do Sul com o Uruguai, onde 80% das pessoas entrevistadas passavam por algum tipo de insegurança alimentar e nutricional. No Oiapoque, que faz fronteira com a Guiana Francesa, o número de migrantes internacionais ou regionais com insegurança alimentar subiu para 96%. 

Representando a Coalizão Negra Por Direitos, a vereadora carioca Tainá de Paula (PT-RJ) reforçou a situação desumana na qual pessoas negras, brasileiras e refugiadas vivem historicamente no Rio de Janeiro. “Somos o estado que mais mata jovens e crianças de 6 a 19 anos no mundo. Não há uma exceção à regra, como no caso de Moïse, que acaba sendo considerado praticamente banal em virtude da ausência do debate racial dessas mortes”.

Para ela, o Brasil deveria ter um papel de responsabilidade pública no tratamento do racismo. “Passamos por Durban, Genebra e temos responsabilidade por toda pessoa negra que chega nesse país. Nós nos beneficiamos economicamente desses tratados e temos contrapartidas, dar conta desses processos migratórios”, afirma Tainá. “Deveria ser inegociável a responsabilização dos nossos órgãos e dos nossos chefes de estado, mas só tivemos o silêncio das autoridades e de Jair Bolsonaro”. 

Violações de Direitos Humanos

Manifestação na Avenida Paulista pedindo justiça para Moïse reuniu cerca de 2.000 pessoas. Foto: TV Uneafro

No sábado, 24 de janeiro, Moïse Mugenyi Kabagambe, jovem congolês de 24 anos, foi espancado e brutalmente assassinado por 3 homens em frente ao quiosque em que trabalhava informalmente, na Barra da Tijuca, Zona Sul do Rio de Janeiro. Organizações que compõem a Coalizão Negra Por Direitos ocuparam as ruas de 12 capitais brasileiras, nos EUA, Inglaterra e Alemanha em protestos, pedindo justiça para Moïse. 

“O Brasil não tem conseguido estabelecer o respeito aos refugiados e aos imigrantes como se diz a lei”, ressaltou José Carlos Dias, presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns, durante a Audiência no Senado, sobre a ausência de resposta do Estado brasileiro sobre a violência contra o congolês. “O negro é visto como descartável, vivemos em uma falsa democracia racial. A família de Moïse veio em busca de segurança e encontrou barbárie”, encerrou.

Djodjo Kabagambe, irmão do Moïse, mostrou preocupação com a falta de responsabilização de todos os culpados pela morte no quiosque. “Nós, familiares, estamos pedindo mais justiça pelo nosso irmão. Existem mais pessoas que participaram do espancamento e que não estão presas. Queremos que a polícia libere o vídeo na íntegra e sem edições”, alertou.

O final da sessão foi marcado por um discurso do Senador Paulo Paim (PT-RS) sobre o caso. “Quantos brasileiros são migrantes no mundo? Nós não gostaríamos que eles fossem tratados com carinho e respeito? As políticas humanitárias precisam avançar no Brasil e no mundo. Essa luta há de continuar”.

Assista a Audiência na íntegra: