Não ao distritão! Pela ampliação da participação negra e popular nos espaços de poder! A proposta do sistema de distritão serve para manter e ampliar o poder daqueles que já ocupam esses espaços. Esse modelo diminui a participação popular no processo eleitoral, enfraquece os partidos e reduz a participação de mulheres, pessoas negras e outros grupos sub-representados no acesso ao parlamento.
Não ao voto impresso! O voto impresso não garante credibilidade sobre o processo eleitoral, facilita fraudes e representa um enorme retrocesso nos avanços conquistados na luta pela democracia. A defesa do voto eletrônico é importante para garantir que o uso da tecnologia aperfeiçoe o sistema eleitoral e seu aprimoramento e transparência permanente.
Por uma reforma eleitoral discutida amplamente com a sociedade civil organizada. Qualquer reforma das regras do jogo eleitoral tem que passar por um amplo debate a fim de promover maior participação dos cidadãos nas regras que definem o exercício de nossos direitos políticos e garantir à sociedade informações qualificadas, claras e precisas sobre o tema.
O sistema eleitoral brasileiro está sob ameaça no Congresso Nacional. Deputados e senadores a toque de caixa estão tentando alterar a Constituição Federal e as regras eleitorais para favorecer a manutenção destes nos cargos de poder e impedir o avanço dos debates sobre democratização e aumento de representatividade do parlamento. Para além da reforma do Código Eleitoral e da legislação atual que regula as eleições no Brasil, os parlamentares querem mudar o nosso sistema eleitoral – deixando de ser um modelo de representação proporcional para um modelo majoritário que favorece a manutenção de oligarquias no poder. De maneira simples, podemos entender que, no sistema eleitoral majoritário, basta que um candidato e uma candidata tenham o maior número de votos para se elegerem. Então, as pessoas candidatas que tiverem mais investimento em suas campanhas, têm maior chance de serem eleitas. O sistema proporcional, ainda que não seja ideal na luta para efetivação de uma maior elegibilidade de grupos historicamente sub-representados na política institucional, é considerado por muitos cientistas políticos como um sistema mais democrático que o modelo majoritário, defendido na proposta de reforma. Esse sistema é dividido em duas etapas, na primeira são computados os votos de
cada partido e, em um segundo momento, são eleitas as pessoas candidatas em ordem de votação, dentro das vagas que cada partido tenha direito. Considerando a resistência dos partidos de forjar candidaturas aliadas à representação política de mulheres negras, pessoas LGBTQIA+, e pessoas indígenas, por exemplo, as dificuldades de eleição desses grupos são uma realidade ainda nesse modelo menos conservador. Segundo Nota Técnica da Frente pelo Avanço dos Direitos Políticos das Mulheres, países que utilizam o modelo proporcional possuem melhores percentuais de representação de grupos minorizados. Norris (2006) afirma que, por exemplo, o percentual de mulheres eleitas em países de sistema de representação proporcional era, em 2005, quase o dobro daqueles onde o sistema era majoritário. Já Sacchet (2018) destacou que, em 2017, países com sistema de representação proporcional tinham, em média, 26% de mulheres em seus parlamentos, enquanto naqueles de sistema majoritário, o percentual era de 16%. Ainda que apresente algumas deficiências, nosso modelo atual consegue garantir a participação popular no processo eleitoral, possui ferramentas de controle para que a transparência seja exigida e as candidaturas sejam construídas em caráter mais coletivo a partir de debate nas instâncias partidárias.
Através do sistema de representação, também é possível que a população, de maneira organizada, tenha instrumentos que viabilizam a prestação de contas e cobrança sobre os resultados e trabalho de parlamentares e de pessoas eleitas do poder executivo. Entre os mecanismos de participação popular, podemos destacar o plebiscito, o referendo e a consulta popular que são garantidos pelo texto constitucional. Podemos também citar outros instrumentos de participação popular que são importantes à democracia e transparência, como, por exemplo, as audiências públicas, conselhos municipais de políticas públicas e as audiências públicas, que aproximam de forma mais direta os movimentos sociais e a população das tomadas de decisões dos governantes. Outro ponto importante quando se trata do sistema eleitoral brasileiro é a representação política de pessoas negras, indígenas, mulheres e LGBTQIA+. Ainda que não estejamos nem perto da paridade de representação política no Brasil, houve um avanço nos últimos anos com o aumento de representação desses grupos sociais no parlamento e a possibilidade da aprovação do “distritão” pode resultar em retrocesso nessa participação, uma vez que candidaturas com pouca estrutura material e financeira teriam ainda menores chances de serem eleitas. Para ilustrar, a pesquisa realizada pelo AFRO-CEBRAP sobre os dados disponibilizados pelo TSE em relação às eleições no ano de 2020 em comparação ao ano de 2016 permite a análise de que houve avanço considerável na representação política nos últimos anos, mas não em proporção ideal, sendo necessário ainda construir caminhos para maior igualdade nas disputas partidárias.
Entre outros importantes dados, a pesquisa aponta que, em 2016, 3.214 homens brancos foram eleitos a prefeituras, porém, em 2020, esse número aumentou, e 3.613 homens brancos foram eleitos prefeitos. Em perspectiva racial, no ano de 2016, 1.545 homens negros foram eleitos para o mesmo cargo e, em 2020, esse número aumentou, sendo 1.492 homens negros eleitos a prefeituras. Porém, em perspectiva racial e de gênero, esse cenário piora quando comparado às mulheres negras, pois, no mesmo ano, foram eleitas apenas 185 mulheres negras. O número de mulheres brancas eleitas como prefeitas era de 470 em 2020, um número bastante superior ao de mulheres negras eleitas. Ainda temos muito que avançar e o modelo do ‘distritão’ coloca obstáculos terríveis à luta pela ampliação da participação popular! O distritão é uma das principais propostas de mudança no sistema eleitoral que vem sendo tratada como uma aposta para as eleições de 2022. O Observatório do Legislativo Brasileiro em nota sobre o “distritão” alerta que esse é um modelo muito pouco utilizado em escala mundial e denominam o distritão como um sistema de voto único intransferível. Nesse sistema eleitoral, os distritos eleitorais ainda são os estados e os parlamentares eleitos são aqueles mais votados em cada distrito (estado) até que todas as vagas em disputa sejam preenchidas. Ainda apontam que, nesse modelo, as suplências partidárias deixam de existir, por exemplo: se um parlamentar ficar ausente do cargo por qualquer motivo que seja, assumirá seu lugar aquele que for o primeiro mais votado não eleito naquele distrito. Nesses moldes, as garantias de que o suplente tenha posições políticas do parlamentar substituído são mínimas,
o que afeta diretamente que sejam efetivados os projetos políticos escolhidos pelo voto popular, por exemplo. O distritão amplia as dificuldades de haver representação de grupos sub-representados na política partidária e garante a manutenção do poder em pequenos grupos que trabalham exclusivamente à manutenção de seus interesses individuais. Por isso, é preciso disputar a ampliação da participação popular na política partidária e isso inclui, de maneira central, garantir a ampliação da participação negra na política para garantir a democracia. A população negra compõe mais de 50% da população brasileira, no entanto, esse dado não reflete em igualdade racial ou social, e esse cenário se agrava quando o tema é a representação política. As pessoas negras estão majoritariamente sub-representadas em candidaturas partidárias e em eleições. Todo e qualquer projeto democrátio neste país deve contar com a perspectiva central das pautas e reivindicações dos movimentos negros. O racismo estrutural marca o histórico de pleitos eleitorais no Brasil e isso se materializa nas grandes dificuldades que são enfrentadas por candidaturas negras se tornarem competitivas. A participação de pessoas negras em processos eleitorais contribui para a efetivação da democracia no país, e possibilita a ampliação dos debates e construção concreta das pautas caras à população negra. Em que pese a luta política histórica travada pelo movimento de mulheres negras para disputar participação na política institucional, e os inegáveis avanços conquistados nesse processo, as mulheres negras permanecem sub-representadas politicamente. Essa situação se agrava diante desses ataques do Congresso Nacional, em alinhamento com a agenda da Presidência, de limitar a democracia e
participação democrática. A democracia está sob ameaça diante das propostas do estabelecimento do “distritão” e o retorno do voto impresso. Enquanto houver racismo, não haverá democracia. Sendo assim, a Coalizão Negra por Direitos propõe a construção de um movimento nacional para defesa da democracia, da participação política e dos avanços históricos conquistados através da luta política do movimento negro, inclusive da luta de mulheres negras feministas sobre as pautas de raça e gênero. Considerando isso, a partir dos eixos de defesa da democracia e do sistema eleitoral participativo, de ampliação da participação negra na política institucional, apresentamos essas propostas. A reforma do sistema político-eleitoral só pode ser possível se pautar com urgência a promoção da igualdade. Para tanto, é necessário que sejam considerados de maneira central o antirracismo, a luta feminista e LGBTQIA+. Não haverá avanços no sistema eleitoral se a estrutura que o perfaz se mantiver machista e racista, representada por homens brancos e seus interesses individuais. A ampliação da participação de pessoas negras, indígenas, transexuais, travestis e gays nos espaços de poder é central, pois garante maior participação do povo na disputa política institucional. Por isso, é importante barrar as ameaças de retrocessos na defesa da democracia e da soberania popular. Enquanto houver racismo, não haverá democracia!