Todas as pessoas que menstruam têm direito à dignidade menstrual por meio do acesso a produtos e condições de higiene adequados. Porém, não para o governo Bolsonaro que, por meio dos vetos ao Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, as impedem de terem acesso gratuito a absorventes íntimos.
Colocando em jogo a dignidade menstrual de jovens, mulheres e pessoas que menstruam, em sua maioria negras e em extrema vulnerabilidade, o Presidente da República, Jair Bolsonaro, vetou artigos do Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual (Lei 14.214) que previam a distribuição gratuita de absorventes menstruais para estudantes de baixa renda de escolas públicas, pessoas em situação de rua, pessoas encarceradas, pessoas em unidades para cumprimento de medida socioeducativa, e em vulnerabilidade extrema.
A justificativa usada é que o projeto de lei não inclui a fonte orçamentária para execução da distribuição. O que não é verdade – a lei indica que o orçamento virá de recursos do Sistema Único de Saúde e do Fundo Nacional Penitenciário.
As pessoas que deixam de ser beneficiadas têm cor e gênero: são meninas, mulheres e pessoas não cis, em sua grande parte negras, com acesso à pouca ou nenhuma assistência pública de saúde e que, muito provavelmente, estão entre as 13,5 milhões de pessoas no Brasil abaixo da linha de pobreza. Essas pessoas não encontram espaço para o absorvente íntimo na lista do supermercado – e agora, sua dignidade menstrual evidentemente não está dentre as prioridades do Estado.
Usar, no lugar do absorvente íntimo, miolo de pão, sacolinhas de supermercado, sacos plásticos, roupas velhas, algodão e outros materiais improvisados para conter o fluxo menstrual é o que precisam fazer milhares de pessoas com útero no Brasil. Além de degradante, do ponto de vista da dignidade, temos também aí inserida uma grave questão de saúde pública que, a cada dia, se aprofunda mais no país.
Essa também é a realidade perversa que atravessa pessoas em situação de privação de liberdade. Não bastasse a péssima infraestrutura e condições de higiene a que estão submetidas nas casas de detenção, resultado da política misógina, racista e punitivista do Estado, situações vexatórias no ato da distribuição de absorventes eram recorrentes. Agora, novas crueldades fazem parte das medidas displicentes do Estado: a privação total do direito ao acesso à higiene menstrual e à saúde íntima.
Nesse quadro também se inserem as meninas, as jovens negras e as pessoas que menstruam em extrema pobreza e que deixam de frequentar a escola em períodos de menstruação pela falta do absorvente, comprometendo o rendimento e, em muitos casos, levando à evasão escolar. Essa também é uma forma da pobreza menstrual refletida com mais violência na vida das mulheres negras.
Cabe ao Congresso Nacional a derrubada desse veto que promove mais um ataque à dignidade e aos direitos das mulheres e todas as pessoas que menstruam, sobretudo das mulheres negras, das pessoas negras. O Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual foi conquistado a muitas mãos – não podemos permitir que Bolsonaro o destrua.
Foto: Coletivo Menstruando sem Tabus Foto: Tiago Ghizoni/Diário Catarinense