Organizações denunciam vulnerabilidade dos quilombos à ONU

A Coordenação Nacional de Comunidades de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), a Coalizão Negra Por Direitos e a Terra de Direitos denunciaram a situação de extrema vulnerabilidade das comunidades quilombolas brasileiras, agravadas ainda mais no contexto da pandemia, nesta quarta-feira (30) ao Grupo de Trabalho da ONU sobre Pessoas de Descendência Africana da Organização das Nações Unidas (ONU) durante a 45ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos.

Em vídeo exibido ao Conselho e aos Estados-membros, a advogada popular da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) e da Terra de Direitos, Vercilene Dias destaca a omissão do governo brasileiro em garantir os direitos constitucionais das comunidades quilombolas. 

 A advogada orientou como racismo institucional expresso no esvaziamento do orçamento para áreas sociais e o desmonte da política quilombola, sob comando de ruralistas e oposicionistas à titulação dos territórios tradicionais, acentuaram as vulnerabilidades dos quilombos, especialmente diante da pandemia da Covid-19. 

A denúncia faz referência à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 742 protocolada pela Conaq e partidos no dia 09 de setembro e que obriga o governo federal a adotar medidas de urgência no combate à pandemia nos quilombos e de proteção a essas comunidades. 

Sob relatoria do ministro Marco Aurélio Mello, a ação foi enviado ao plenário do STF na última semana para julgamento pelos ministros. O Ministro também pediu pareceres da Procuradoria Geral da República (PGR) e da Advocacia Geral da União (AGU) em até cinco dias. No início desta semana o Grupo de Trabalho da ONU apresentou informe no qual destaca, de maneira crítica, a manifestação do racismo sistêmico no Brasil.

Mesmo com a intensa subnotificação do critério raça/cor/etnia em mais de 25% do total de óbitos, a população negra corresponde a 41% do total de óbitos, de acordo com o boletim epidemiológico nº 28 do Ministério da Saúde, de 26 de agosto. Neste quadro de invisibilidade da manifestação da doença na população negra, as realidades presentes nas comunidades quilombolas é ainda menos reconhecida pelo governo federal, já que o Estado não tem mapeado e divulgado os casos de infecção e óbitos nas comunidades.

Diante da lacuna informativa, a Conaq tem mapeado voluntariamente a manifestação dos casos e constata que os povos quilombolas estão mais suscetíveis a morrer de Covid-19 que o resto do país. A taxa  de  letalidade  desse  grupo  é  de  3,6%,  enquanto a  da  população  em  geral  é  de 3,1%, dado subnotificado por não haver monitoramento dos casos e mortes entre quilombolas pelo Estado brasileiro.

Além da ausência de ações dirigidas à população quilombola no contexto da Covid-19,  a intensa desigualdade social e abandono estatal implica em maior vulnerabilidade à doença. Cerca de 75% da população quilombola vive em situação de extrema pobreza, dispondo de precário acesso às redes de serviços públicos, aponta uma pesquisa do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. 

Apenas 15% dos domicílios têm acesso à rede pública de água e 5% à coleta regular de lixo, e em 89% dos domicílios o lixo doméstico é queimado. Só 0,2% estão conectados à rede de esgoto e de águas pluviais. O acesso à água e estruturas adequadas de saneamento são apontadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como essenciais para proteção à disseminação desenfreada do coronavírus. A população quilombola também não consta como destinatária de políticas públicas específicas no Plano Plurianual (PPA) 2020-2023.